Hoje comemora-se o dia internacional dos museus, com o objetivo de conscientizar o público em geral sobre o papel destes espaços no desenvolvimento das cidades. E para lembrar esta data, viajaremos para o Museu do Louvre em Abu Dhabi, a primeira filial do Museu fora da França. Mas engana-se quem imagina ser uma réplica da sede francesa. Trata-se de uma instituição com uma interpretação própria do conceito de museu universal, com arrojo em sua forma arquitetônica, sem deixar de lado as referências à cultura local (que são muitas, confere no post!).
O Museu de Abu Dhabi fez parte de uma grande parceria entre o governo francês junto aos Emirados Árabes, de modo a colocarem o país do Oriente Médio entre as grandes rotas de museus no mundo. Sendo assim, o primeiro objetivo do Museu foi atingido: colocar capital dos Emirados Árabes Unidos entre um dos destinos culturais reconhecidos internacionalmente pelas ações que envolvem arte, cultura e educação. Consequentemente houve um impacto sobre o desenvolvimento do turismo, da educação e dos serviços locais, que atendem uma sociedade que se planeja para uma economia pós-petróleo.
A edificação foi construída em uma ilha natural com 27km², chamada Ilha Saadiyat (ilha da felicidade), que acabou tornando-se um distrito cultural com outras instituições com fins similares. O projeto foi assinado pelo arquiteto Jean Nouvel, que já havia assinado o Instituto do Mundo Árabe, em Paris (e que certamente será tema de outro post). Pelas características de suas obras, Nouvel ficou conhecido pela experimentação e ousadia, materializando o que ele mesmo diz, cada obra é concebida sem influências externas, são compostos com “a mente limpa”. Será?!?! São tantas referências locais, que certamente a leitura do entorno feita pelo arquiteto e equipe são incontestáveis! O fato é que a mescla de transparências, luzes e sombras também são elementos bastante presentes: “Todos os meus edifícios têm diferentes aspectos em função da hora do dia, do tempo que esteja fazendo, se chove ou se é noite. Para mim há algo de muito poético nessa consciência da eternidade sugerida na fragilidade de um instante”
Outro objetivo do Museu do Louvre de Abu Dhabi também é atingido ao impactar fortemente os visitantes pela experiência arquitetônica, criando um espaço que não cumpre apenas a função museológica, mas que, nas palavras do arquiteto, se pretende corresponder “a função de santuário das obras de arte mais valiosas”.
Sobre a plástica do edifício pode-se assim descrevê-lo:
– um domo que destaca-se na paisagem, que possui mais de 7.500 toneladas, que proporciona uma filtragem da luz, gerando o que ficou conhecido como “chuva de luz”. Esta sombra é gerada dentro dos seus 180m de diâmetro, uma solução importante para proteger os visitantes, mesmo sob o Sol escaldante.
– este domo é apoiado em 4 piers (recuados na composição) que proporcionam uma sensação de que a cobertura está flutuando sobre a água. Além disto, a estrutura lembra uma cobertura feita com folhas de palmeiras, num entrelaçado de renda metálica, que proporciona uma poética experiência de luz e sombra. E aqui a referência à arquitetura árabe, os mashrabiyas, (no Brasil conhecido como muxarabis), uma espécie de treliçado colocado em frente às janelas, e que ao mesmo tempo que permite a ventilação, proporcionada privacidade e uma iluminação rendilhada através das aberturas (uma releitura moderna desta solução foram os cobogós, tão populares atualmente).
– estes elementos da cobertura, abrem e fecham-se de forma a regular a luminosidade no interior do edifício. Solução similar ao que o arquiteto utilizou no Instituto Mundo Árabe.
– o complexo é composto por 55 pavilhões separados, que simulam a organização espacial de uma Medina, ou Almedina, cidadelas árabes fortificadas ou centro histórico de diversas cidades do noroeste da África que costumam ser muralhadas, com ruas estreitas e labirínticas. Nestes pavilhões, as exposições foram organizadas em uma sequência cronológica, podendo ocorrer exposições especiais em pavilhões específicos.
Outro elemento da cultura local que aparece contemplado no projeto são os canais de irrigação chamados de falaj, e que são traduzidos para o museu através de um canal que atravessa a edificação, transformando o interior em um oásis, equilibrando termicamente o espaço, além de ser um indutor do passeio, conduzindo o visitante a seguir o seu percurso. E esta é uma das muitas soluções de conforto ambiental para o edifício, que conta também com especificações de materiais que absorvem pouco o calor (aliado ao uso de cores claras), que geram sombras internas e mantém o espaço ventilado.
Algumas polêmicas envolveram a construção tanto no que tange à sua execução (as condições sob as quais os trabalhadores construíam o espaço), quanto com relação ao prazo de finalização (com uma demora de 5 anos além do previsto) e à disputa do espaço com as obras nele expostas. Porém, desde 2017 o Museu entrou no circuito internacional das grandes exposições de arte, além de oferecer uma experiência arquitetônica única aos visitantes e apresentar alguns dos objetivos dos espaços de exposições culturais.